Uma palavrinha para o espírito: a máxima e a blague
Se não há uma linha clara a unir a forma clássica da máxima à experimentação modernista, há porém, entre a máxima e a blague, algo em comum.
Basta lembrar que, na galeria um tanto desorganizada das inspirações de Oswald de Andrade, o Nietzsche que ele lê com júbilo não chega nunca a separar-se completamente de Freud. Um Freud todo especial, a propor, contra a pura valorização do instinto, uma narrativa sedutora que abriria, no seio da ideia do humano, o abismo do inconsciente.
A sedução da psicanálise, já notou Ricardo Piglia – também ele cultor das formas breves –, vem da ideia de que afinal seríamos formados por duas histórias: aquela superficial, que enxergamos e apregoamos, e uma outra, profunda e opaca, misteriosa a nós mesmos. Um enredo desconhecido, que é e não é o nosso.
A máxima, ou as formas breves (e como chamá-las, a partir daí?), encontram então terreno fértil, porque de repente aquilo que elas dizem sem dizer pode ser o afloramento de um fantástico discurso paralelo, em que se guardariam os segredos que a lógica e a razão soem dissimular. Daí a proximidade entre o chiste freudiano e a máxima.
“Chiste” freudiano que, em francês, vai chamar-se, sugestivamente, mot d’esprit…
1 Comment
Join the discussion and tell us your opinion.
Breve a sua reflexão, Pedro, mas muito significativa. Aí estaria um elo, creio eu, entre Guimarães Rosa e Oswald de Andrade, por quem GR não tinha aliás grande apreço estético. Se o Macunaíma abre uma vereda importante para GR – e ele tbm detestaria admitir isso – a blague Oswaldiana não é menos importante. Basta reler o primeiro prefácio de Tutaméia, um ensaio clássico sobre formas breves e sobre blagues num livro profundamente modernista e cheio de blagues.
E eu até incluiria nesse fascinente rol de formas breves com inflexão modernista, Pedro, o microconto de Augusto Monterroso. Nada mais freudiano do que o famoso “El dinosaurio”:
Cuando despertó, el dinosaurio todavía estaba allí.
Mais “retorno do reprimido” impossível, não é?
Abs do “vizinho”,
Paulo