Sino peregrino
(Para a Andréa)
Que som será?
É um sino que bate e me desperta.
Suas badaladas de apelo não ecoam,
Escoam até mim, líquido brônzeo,
Inequívoco em seu chamado.
É um sino peregrino que bate.
Sinto-o a forçar o espaço,
Rasgando-o com alguma mensagem funda,
Chamando.
Chamando, clamando, ordenando (o pobre!),
Como se o convento ainda existisse,
Como se os séculos não passaram,
Como se eu não fosse estrangeiro, mudo eu mesmo,
Como se o campanário fosse ainda o mais alto ponto da cidade,
Como se o povo ainda acudisse ao clamor,
Como se ainda o assombrasse o divino pavor de perder-se.
Estranho sino peregrino.
Bate do fundo, do tempo
E eu não posso compreendê-lo.
Se ao menos pudesse vê-lo em sua plena idade,
Congregando, como convém aos sinos,
Anunciando, como convém,
Compassando o tempo dos homens
A um outro tempo, desejado.
Invisível povoado que se forma,
Que tece na escuta
De um sino que toca
Suas certezas.
Estranho sino peregrino.
Bate do fundo, do tempo
E não posso responder.
Não posso. Não posso.