As ruínas de Palmira
Agora que o “Estado Islâmico” dinamitou o templo Baalshamin, na Síria, é tempo porventura de voltar às reflexões do conde de Volney sobre as ruínas.
Revolucionário, viajante, professor, agricultor frustrado, Volney foi uma daquelas almas inquietas que a França revolucionária acolheu e projetou.
O primeiro anúncio de seu livro Ruines, ou Méditations sur les révolutions des empires apareceu em 1791. O título já é uma pequena joia, e nos faz perguntar se a imaginação da “revolução”, neste amigo de Benjamin Franklin, não é também um problema cósmico: os impérios vêm e vão, como os planetas, enquanto nós somos a poeira infinitamente diminuta de um gigantesco sistema. Sintomaticamente, o livro se inicia com um elogio às tumbas e às ruínas, as quais, recordando aos homens a brevidade de sua passagem pela terra, deveria combater-lhes a cupidez e a arrogância.
Palmira aparece – “cette désolée Palmyre” – como a fonte de recordações de tempos não vividos, e o autor insiste, numa evocação àquilo que o tempo deixou, que ela lhe revele as “revoluções de sua fortuna”.
A bela prosa de Volney, que hoje classificamos na prateleira já um pouco desgastada do “orientalismo”, é puro encantamento diante do deserto que circunda as ruínas, em meio às quais ele se entrega à meditação sobre a cidade opulenta que um dia esteve naquele lugar, onde hoje não resta senão um esqueleto, esquecido no silêncio noturno invadido apenas pelos sons lúgubres de alguns pássaros e do chacal, esta “espèce de renard qui ne vague que pendant la nuit” [espécie de raposa que vaga apenas à noite].
O que, exatamente, cruza a imaginação de Volney e dos amantes de ruínas, tão comuns, aliás, naquele tempo de revoluções e contra-revoluções? Com o que sonham?
No caso de Volney, a força extinta que ergueu aqueles templos e cidades é atribuída, no espírito do tempo, ao concurso das forças de indivíduos “livres e apaixonados”, perdidos agora na memória incerta do escritor.
Bela utopia do passado, projetada por quem viveria logo mais o terror revolucionário, mas que mantinha e manteria, ainda, a fé na revolução dos impérios.
A ingenuidade de Volney, como a de tantos de seus contemporâneos cultos, era a crença na virtude humana, que seria despertada se seguíssemos as leis da natureza. O final do livro é tocante, simples, discretamente moralizante, e me faz pensar na brutalidade dos homens que dinamitaram as ruínas de Palmira:
Conserve-toi;
Instruis-toi;
Modère-toi;
Vis pour tes semblables, afin qu’ils vivent pour toi.